quarta-feira, 13 de julho de 2011

MINHA MONOGRAFIA (Parte II)

A MORTE DE DEUS - UM EVANGELHO PARA ESPÍRITOS LIVRES


2 NIETZSCHE: UM HOMEM, UM LOUCO – PURA DINAMITE

O século XIX teve o privilégio de ver nascer em um de seus dias um dos seres humanos mais controversos da história da humanidade e, curiosamente, um dos raros exemplos de sinceridade, determinação e amor à vida. A 15 de outubro de 1844, nascia no vilarejo de Röcken, na antiga Prússia, o menino que, anos mais tarde, abalaria os alicerces da moral, da cultural e da religião do ocidente – o pequeno Frederico – mas para o mundo inteiro, Nietzsche, o homem-dinamite.
Apesar de ser palco para a existência de Friedrich Wilhelm Nietzsche, o século XIX, no entanto, foi um campo inglório para um lutador pertinaz, e esse fato faria com que o próprio Nietzsche se intitulasse um “extemporâneo” – um homem fora de seu tempo, nascido póstumo ou predestinado ao amanhã. Na verdade, Nietzsche vivia para além de seu tempo, sua filosofia não soava bem aos ouvidos dos seus contemporâneos e, principalmente, a seus compatriotas, os alemães – contra os quais não poupará artilharia (Lutero, Kant, Schopenhauer e Wagner são alguns de seus alvos prediletos). A filosofia nietzscheana chegara cedo demais, antes do alvorecer dos “espíritos livres”. Não obstante, Nietzsche sempre escrevera e se pronunciara em suas obras como “nós, os espíritos livres”, vislumbrando no horizonte da humanidade esses seres superiores, vaticinando um novo alvorecer para uma nova, livre, humanidade.
A trajetória de Friedrich W. Nietzsche, ao longo dos seus 56 anos de vida, tem peculiaridades que dificilmente alguém acreditaria, não fossem as fontes fidedignas dos relatos a seu respeito. Filho e neto de pastores luteranos, com todas as probabilidades de se tornar mais um, pois já em sua infância fora apelidado de “pastorzinho” pelos colegas de escola, que testemunhavam seu ar austero de pequeno pregador, contraditoriamente, Nietzsche despontaria mais tarde como o maior opositor tanto da moral quanto da crença cristãs, fundamentando todo o seu levante contra o cristianismo em uma única declaração: “Deus está morto!”.
Com sua máxima, Nietzsche pouco se importa de ser acusado de blasfêmia – essas palavras do dicionário da moralidade cristã não surtem efeito nele. Se o critério é a moral cristã, então Nietzsche deve ser considerado “amoral” – e essa sim é uma acusação que lhe soa bem!
O filósofo, com sua declaração, não pretende matar nenhum deus, nenhuma divindade religiosa, nenhum ser supremo criador de todas as coisas. O que ele quer realmente é desbaratar essa invenção da fraqueza humana, esse ser metafísico criado na mente humana para se arvorar em juiz e caluniador das ações dos homens, esse dedo, teso, leviano, que nos imputa culpa ainda no berço da inocência, que não espera nem mesmo uma primeira ação e brada, antes de tudo, “tu és fruto do pecado!”.
Nietzsche denuncia que a busca (patológica) por um fundamento de si mesmo – um “explicar-se no mundo” – levou o homem, não exatamente a um “religare”, uma religião, e sim a uma decadência, a uma perda de auto-estima, à humilhação de si mesmo.

“Eis uma história lamentável: o homem busca um princípio no qual possa apoiar-se para desprezar o homem – inventa um mundo para poder caluniar e poluir este mundo: realmente estende sempre sua mão em direção do nada, e desse nada constrói “Deus”, a “verdade”, e por todas as maneiras, juiz e condenador deste ser...” (Nietzsche 2004, p. 231).

Após inventar um “Deus” que justificasse a existência, o homem inventou também uma “verdade”, um “destino supremo”, uma “salvação” – salvar-se a qualquer custo do medo do próprio destino. Todas essas invenções mirabolantes, para o filósofo, são frutos do pior tipo de covardia:
“(...) muitas vezes a submissão à vontade de Deus, e a humildade, nada mais são que o manto lançado sobre a covardia que sentimos no momento de afrontar com bravura o nosso destino”

(NIETZSCHE, 2004, p. 231).

A criança arredia, de difícil convívio social, porém imensamente dedicada à leitura e aos estudos, cresceu apreciando música e poesia de boa qualidade, estudou latim, hebreu e teologia, além de botânica, geologia e astronomia. Especializou-se em filologia clássica e, só veio a interessar-se por Filosofia, após ler “O mundo como vontade e representação”, de Arthur Schopenhauer (1788 – 1860). Aos 24 anos, foi nomeado professor de filologia clássica, na universidade da Basiléia. Dava cursos e palestras. Era apaixonado pela antiga Grécia – sua arte, sobretudo a tragédia, seu modo de vida, os homens e os deuses gregos. Se há um deus, então que seja Dioniso, o deus da exuberância, da desordem e da música. Até a Grécia, a pátria da beleza, foi corrompida. A “razão tirânica”, a dialética socrática roubou a beleza grega, e a “Tragédia” conheceu sua própria tragédia. Nietzsche fez críticas ferrenhas à música e à arte modernas, que para ele eram a própria expressão da decadência.
O que há de mais chocante, porém, na vida do homem Nietzsche, é seu constante estado doentio, iniciado por volta do ano de 1873 – dores de cabeça, dificuldades na fala, perturbações oculares, insônias, problemas estomacais. Apesar dos vários tratamentos a que se submeteu, sua saúde tornava-se cada vez mais deplorável, culminando com a loucura e, anos mais tarde, a morte, a 25 de agosto de 1900.
A despeito de todo sofrimento, o filósofo demonstrou, heroicamente, profundo amor à vida, nunca se deixando abater, e por que não dizer?, fazendo da adversidade sua razão de viver. Amor fati, amor ao destino, foi seu lema de resistência. O que há de contraditório em sua filosofia é exatamente o que a fundamenta: derrubar todos os valores, todos os ídolos, e ao mesmo tempo criar outros valores, fiéis ao sentido da terra e à natureza do homem e anunciar o super-homem; desconstruir a morada do Deus cristão e os alicerces de toda a moralidade de cunho religioso, para inaugurar ali um imenso salão, onde homens e deuses possam, finalmente, viver e dançar juntos. Nietzsche acreditaria somente num Deus que soubesse dançar: “Agora, estou leve; agora, vôo, vejo-me debaixo de mim mesmo; agora,um deus dança dentro de mim”
A crítica nietzscheana ao cristianismo não é leviana nem infundada, pois o filósofo sempre se baseia em evidências e perspectivas históricas, tanto da humanidade quanto do próprio cristianismo. A antiga Grécia e a moderna Alemanha são para Nietzsche provas incontestes de como Sócrates e Platão deturparam a beleza grega e, posteriormente, como o cristianismo alquebrou as forças dos povos bárbaros germânicos. A vida foi posta a grilhões e o homem transformado em réu e carrasco de si mesmo.
Também é infundada a acusação de revanchismo às adversidades de sua existência. Nietzsche não se prendeu unicamente a um anticristianismo, foi também antigermânico, demonstrando como o povo e a cultura alemães enfraqueceram a virilidade dos povos bárbaros da Europa e entre seus expoentes estão aqueles que mais reforçaram a filosofia e a moral cristãs.
Não nada em toda a filosofia nietzscheana que não traga, concomitantemente, o peso da abordagem histórica e psicológica. O filósofo jamais se deixou levar por lucubrações metafísicas ou fantasiosas de qualquer gênero. Sua linguagem é poética, porém agressiva; muitas vezes ela é bíblica, denunciando sua religiosidade mundana. Seu amor pelo sentido da Terra só lhe permitira uma idéia extravagante: a do super-homem - “O homem é algo que deve ser superado”, “o homem é uma corda estendida entre o animal e o super-homem – uma corda sobre um abismo”, assim falou Nietzsche.

- Este trabalho continuará em próximas edições. Aguardem!!!

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