sexta-feira, 26 de agosto de 2011

MINHA MONOGRAFIA (Parte IV)

CONTRA O CRISTO OU CONTRA O CRISTIANISMO?

Nesta quarta parte de minha monografia, tento mostrar que Nietzsche, apesar do título que deu a seu livro, "O Anticristo", faz ataques veementes não exatamente ao Cristo (e diz que ele foi "o único cristão verdadeiro"), mas ao Cristianismo, o qual combate em toda sua obra.
Acompanhe mais um capítulo e deixe seu comentário. É importante!


2.2 Quem é o anticristo?*

O título “O Anticristo” provavelmente leva a uma apressada interpretação de que a obra de Friedrich W. Nietzsche assim denominada seria um manifesto contra o Cristo, o nazareno. Aos milhões de cristãos do mundo inteiro, tal título já é suficiente para repudiar o livro e condenar por blasfêmia tão maldito autor ao fogo eterno do inferno, sem direito ao purgatório. No entanto, apesar de o nome Cristo, para os fiéis, ser indissociável do nome Deus, chegando mesmo a serem um e único ser, sob o ponto de vista do filósofo alemão, um e outro são personagens completamente diferentes. Deus, para Nietzsche, é uma invenção mental ardilosa dos hebreus, resultante da fraqueza e da covardia de um povo que, temendo por seu destino, teve a necessidade de se sentir submetido, e ao mesmo tempo protegido, a uma entidade metafísica, que pairasse acima das vicissitudes humanas e, principalmente, legislasse a seu favor. Por outro lado, Cristo, o ungido, é um personagem humano, portanto histórico, de carne e osso, emergente de uma cultura impregnada de secular esperança religiosa no advento de um representante desse “Deus” na Terra.
Em seu prefácio ao livro “O Anticristo”, o mestre em Ciências da Religião pela PUC-SP, Mauro Araújo de Sousa esclarece esse ponto de vista do filósofo da seguinte maneira:
“É bom que se esclareça também que há uma grande diferença para o filósofo entre Cristo e o cristianismo. E, se ele posiciona-se como o anticristo, é porque quer despertar uma nova cultura que não seja embasada em leituras que se fizeram de Cristo e nem do próprio Cristo, que para Nietzsche não passava de um romântico que pretendia mudar as coisas a partir do seu bom coração”.
E mais a frente acrescenta:
“(...) o anticristo não considera Cristo como um fanático, mas o ver como criança, em inocência, sem rancor. O mesmo não acontece com o Cristianismo, a pátria do ressentimento”. Para concluir Souza sentencia: “Que tipo de leitura, em suma, Nietzsche faz de Cristo? Uma pessoa boa que atravessou todas as lutas construindo aqui mesmo o seu “Reino dos céus”.”
O próprio Nietzsche tem palavras bastante conclusivas sobre o nazareno, que, se não apascentam a revolta dos cristãos contra ele, pelo menos, não se pode deixar de notar que são palavras de uma análise profundamente honesta e sóbria de um personagem histórico, não de um mito divino:

“A própria palavra “Cristianismo” é já um equívoco – no fundo só existiu um cristão, e esse morreu na cruz. O “Evangelho” morreu na cruz. Aquilo a que desde então se chamou “Evangelho” era o contrário do que o Cristo havia vivido: uma “má nova”, um “Dysangelium”. É falso até à estupidez o ver numa “fé”, neste caso a fé na salvação por Cristo, o sinal distintivo do cristão, só a prática cristã, uma vida tal como a viveu aquele que morreu na cruz, é cristã...”

(NIETZSCHE, 2000, p. 73-74).
Comparado ao que o filósofo dirá sobre Deus, deve ficar evidente quão diferenciadas são as noções que ele tem de um e de outro:

“A concepção cristã de Deus - Deus como Deus dos doentes, Deus que tece como aranha, Deus espírito – é uma das mais corruptas concepções de Deus a que sobre a Terra se tem apresentado; representa até, possivelmente, o nível mais baixo de evolução declinante do tipo divino: Deus degenerado em contradição da vida em vez de ser a sua glorificação, e a sua eterna afirmação! Declarar guerra em nome de Deus à vida, à natureza, à vontade de viver! Deus, essa fórmula para todas as calúnias contra o “aqui e agora”, e para todas as mentiras do “além”! O nada divinizado em Deus, a vontade do nada divinizada”

(NIETZSCHE, 2000, p. 51-52).

Assim, “O Anticristo” é mais propriamente um “anti-Deus”, “anticristianismo”, “antídoto” contra os detratores da vida, contra os traidores da terra, contra os pregadores da morte – numa palavra, contra todos que não são dignos de desatar as sandálias dos espíritos livres.
O ser metafísico, ao qual se opõe o filósofo, o legislador do mundo e da
humanidade, “O Deus único”, deixou denunciar sua inexistência quando desamparou a primeira e última esperança de redenção:
“Eli, Eli, lamma sabactáni!” (Mateus 27:46).


* Esta publicacção continuará em edições futuras. Não perca!!!

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