segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

UMA EXPERIÊNCIA EM SALA DE AULA

O SENHOR É ATEU?
Por Jaya Hari Das*


Minha experiência até o ano passado como professor de inglês me dizia que eu já sabia muito sobre uma sala de aula, dando aulas para alunos de cursos específico do idioma e outros do ensino médio. A relação entre mim e meus alunos sempre foi boa e a receptividade deles na primeira aula pode ser considerada dentro do esperado. Mas, no início do ano passado, comecei a dar aulas de Filosofia numa escola pública de ensino médio. Um novo desafio – nada de ensinar a conjugar to be e to do, ou meter a língua entre os dentes para pronunciar o difícil “th” inglês. Agora eu teria de “mexer” com as cabeças daqueles jovens recém-apresentados à disciplina, apresentar a eles aqueles “gregos esquisitos”, despertar neles a tal da “atitude filosófica”, o senso crítico, um olhar diferente do mundo. Assim, logo na minha primeira aula, achei conveniente saber o que eles pensavam sobre a Filosofia e quais suas expectativas para a disciplina.

Estudantes são “criaturas barulhentas”, mas se o professor lhes faz um questionamento, mesmo deixando-os à vontade para dizer o que bem entenderem, eles fazem um silêncio angustiante. É preciso convocá-los, provocá-los, escolher alguém entre eles, receber um monte de “eu, não!”, até que um deles resolve falar. E foi assim que um deles falou: “O senhor é ateu?”.

Juro que não contava com aquela pergunta. Uma pergunta difícil de ser respondida, sobretudo para aqueles com os quais você conviverá por todo o ano letivo, tentando ser simpático, para que sua disciplina seja bem-aceita e seu dever como professor seja cumprido, ao menos, de maneira “razoável”. Tive de ser ágil o suficiente para não dar a impressão de que fora posto em “cheque- mate” por um aluno do ensino médio, logo na minha estreia.Sem querer, aquele aluno me deu a grande oportunidade de criar, ao mesmo tempo, um chavão e uma metodologia de ensino para minha nova disciplina. Foi, sem dúvida, Sócrates, o grego, quem me acudiu naquela tarde calorenta de início de maio. Fui em direção ao aluno que fizera a pergunta e, sob os olhares apreensivos de seus colegas, diante da “ousadia” do perguntador, cheguei bem perto dele e perguntei: “O que significa ‘ser ateu’ pra você?”.

É claro que ele não me respondeu, mas também não retrucou que eu estava tentando fugir à sua pergunta. Isso, no entanto, foi o suficiente para começar aquela aula inaugural. E, como disse anteriormente, orientou todo o meu trabalho na disciplina de Filosofia, pelo menos para aquele ano. Esse fato que se passou tal qual acabo de relatar, numa experiência real em sala de aula, prova que a Filosofia como disciplina pode ser tão fascinante e prática quanto é em seu sentido mais originário. Existem muitas possibilidades de se ensinar Filosofia, vivenciando seus elementos mais estruturais e básicos: a dialética, a maiêutica, a crítica e até o ceticismo.

A cada início de aula, eu convocava meus alunos a serem “sem-vergonhas”. Provocava-os a falar e a perguntar, sentenciando que “só os ignorantes” são “envergonhados”, por isso não ousam saber, e que, ao mesmo tempo, são “desavergonhados” por não terem vergonha da própria ignorância e imbecilidade em que se acomodaram. Disse a eles que só se pode responder bem a uma pergunta, não quando se sabe a resposta, mas quando se conhece bem “aquilo” sobre o que ela pergunta. Ensinei-lhes que é fácil “crer”, pois é uma atitude “negativa”, “passiva”, que não necessita de esforço, porém, “saber”, por ser uma atitude “positiva”, “ativa”, resultante da vontade, é a atitude daqueles que conhecem a “fé” pelo seu lado “prático”, e que, só assim, fé e conhecimento podem caminhar juntos, como a Filosofia (que sempre foi uma espécie de “advogado do diabo”) tem caminhado com a Ciência e a Religião, sempre aparando as arestas do absurdo.


*Jaya Hari Das é Filósofo e Fundador do Moficushinth – Movimento Filosófico “Cura do ser humano integral” – Terapia Hari.
E-mail: moficushinth@yahoo.com.br
Blog: http://terapiahari.blogspot.com
Twitter: jayaharidas

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